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Evolução Humana: a base científica moderna

Categoria: Blog

Evolução Humana: a base científica moderna

O USP -Talks é um evento que pretende aproximar a universidade da comunidade, estabelecendo um canal direto. Segue entrevista com o professor Nelio Bizzo, com perguntas do jornalista Herton Escobar  que faz a mediação do evento, que contará, além do prof Nelio,  com o prof. Walter Neves. Neste blog aparece a versão integral da entrevista, sem edição. Logo em seguida, há espaço para perguntas, que serão respondidas no evento, ou aqui mesmo! Aproveite!

1- Qual era a percepção da evolução humana no século 19, quando Darwin publicou “A Origem das Espécies”?

Nelio Bizzo: Ainda na Magna Grécia Empédocles defendia a ideia de que os seres vivos, humanos inclusive, haviam aparecido por combinações aleatórias, havendo bovinos com cabeças humanas, humanos com cabeças bovinas, assim como humanos e bovinos com as cabeças que conhecemos hoje em dia. Ele dizia que só teriam sobrevivido as combinações viáveis. Aristóteles, um século depois, criticou essa ideia, e, de certa forma, estabeleceu as bases da compreensão cristã da perfeição da natureza humana. De certa forma, ela persistiu até que Charles Darwin trouxesse elementos concretos para se pensar em um processo dinâmico na base da origem do ser humano e de todas as espécies.

2- Como é que cientistas, religiosos e a sociedade reagiram à inclusão do ser humano na sua teoria evolutiva?

Nelio Bizzo: Não é difícil perceber que o público em geral não lida bem com a ideia de que nós e todos os primatas temos um ancestral comum. (Aliás, até mesmo que todos os humanos somos aparentados). Se isso pode ser percebido ainda hoje, não é difícil imaginar como tenha sido em meados do século XIX. Os cientistas se dividiram em função de sua visão da importância do cérebro. Um grupo pensava que o desenvolvimento do cérebro teria sido a causa central da especiação humana, enquanto outro grupo acreditava que a postura ereta fosse a chave crucial para a diferenciação entre os grandes primatas (que não são verdadeiramente bípedes) e a linhagem humana.

 

3- Como é essa percepção hoje — no mundo e no Brasil, especificamente? Se há tantas evidências científicas corroborando a teoria de Darwin sobre a evolução humana, porque isso ainda é um tema tão polêmico?

Nelio Bizzo: Darwin estava nesse segundo grupo que defendia a postura ereta como decisiva para as outras características, e hoje a maioria (se não a totalidade) dos especialistas defende que a postura ereta precedeu o cérebro avantajado. A polêmica não reside precisamente nos detalhes da teoria, dos quais ainda há muito a esclarecer, mas, sobretudo, a suas consequências morais e religiosas. Muitas religiões defendem uma criação absolutamente especial para o ser humano, diferente de qualquer outro animal, mas para os evolucionistas não há razão para essa diferença, havendo inclusive muitas evidências de como os processos evolutivos são iguais, em humanos e em todos os demais seres vivos.

 

4-  A ciência e a religião são antagônicas no que se refere à evolução humana? É possível acreditar em Deus e na evolução ao mesmo tempo?

Nelio Bizzo: O livro mais famoso de Darwin, “Origem das Espécies”, publicado em 1859, traz diversas menções ao “Criador”. Paulo Abrantes, professor da UnB, e referência na área, defende a ideia de que Darwin não era propriamente um materialista, pois admitia, por exemplo, que a origem da vida pudesse ser explicada por um “sopro divino”. A segunda edição do livro, publicada logo em 1860, traz essa expressão literalmente. Darwin cita o teólogo anglicano Baden Powell (1796-1860), professor de Oxford, já na introdução da primeira edição, como um teólogo evolucionista. Assim, não há dúvida de que religiosidade e evolucionismo não são mutuamente excludentes, aliás, como a grande maioria das denominações religiosas assim estabelece hoje em dia.

5- O que o senhor acha de iniciativas que buscam coibir o ensino da evolução e/ou obrigar as escolas a também ensinar o criacionismo como uma “teoria alternativa” à evolução?

Nelio Bizzo: Acho que não se pode apresentar uma doutrina religiosa, inquestionável, como uma “teoria alternativa”. Teorias devem ser questionadas, obrigatoriamente, mas pessoas que fizeram isso com doutrinas religiosas já acabaram queimadas vivos na fogueira. Antonio Stoppani (1824—1891), grande geólogo italiano, padre católico e chamado pelo historiador Pietro Redondi (autor de Galileu herético) de “criacionista retardatário”, afirmava que a busca de comprovações empíricas da doutrina religiosa nada mais é do que prova de pouca fé. As religiões nos pedem fé, crença em dogmas, sem questionamentos ou exigência de comprovações; postura inteiramente diferente nos convida a tomar a ciência, que nos incita com o desafio da dúvida, a exigência de comprovação, o teste de hipóteses. O que não pode ser colocado à prova não é científico, quem tem fé em uma doutrina religiosa não pode ter dúvidas. Má ciência não produz boa religião.

 

6-Muitas pessoas entendem o temo “teoria” como algo que ainda precisa ser comprovado. A teoria evolutiva de Darwin — especialmente no que se refere à evolução humana — pode ser considerada uma “verdade científica” tão sólida quanto as teorias de Albert Einstein na física, por exemplo, ou é uma teoria que ainda carece de comprovação experimental?

Nelio Bizzo: A comparação é interessante, porque mesmo depois do famoso experimento de Sobral (1919), Hitler pensava que poderia derrubar a Teoria Geral da Relatividade de Einstein. Mas ele pretendia fazer isso com base em seu poder político, e que, por seu judeu, Einstein não poderia produzir teorias válidas. No entanto, disso não decorre que as teorias de Einstein sejam inquestionáveis, aliás, o próprio fato de terem sido colocadas à prova em 1919 é evidência de que poderiam ter sido derrubadas. As ideias de Darwin foram colocadas à prova muitas vezes; é um erro grosseiro acreditar que, como a evolução requer muito tempo para uma espécie originar outras, isso torna impossível qualquer tipo de experimento. Muitas ideias de Darwin foram derrubadas, por exemplo, a de que a bexiga natatória dos peixes originou os pulmões dos peixes pulmonados. Essa ideia, presente no “Origem das Espécies”, foi colocada à prova e estudos de embriologia e biologia do desenvolvimento indicam até o contrário. Mas muitas outras, também colocadas à prova, se saíram fortalecidas, por exemplo, a ideia de que as baleias se originaram de mamíferos terrestres e não de répteis marinhos extintos, como os plesiosauros. Essa era a opinião dominante à época, tanto que o fóssil mais antigo de baleia, descrito em 1834, foi denominado Basilosaurus (“rei dos lagartos”).  Hoje se conhece a sequência quase completa das espécies intermediárias que levara à origem dos cetáceos modernos a partir de um mamífero terrestre (Pakicetus attocki), que vivia à beira d’água há 50 milhões de anos, no Eoceno. Essa hipótese de Darwin se saiu fortalecida.

Bibliografia:

Se você quiser se aprofundar no tema da evolução humana, a revista Ciência e Ambiente 48 traz uma coleção de artigos com o que há de mais recente:

http://livrariaufsm.com.br/revista-ciencia-ambiente-48-evoluc-o-humana.html

Bibliografia

 

 

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